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Como o estoicismo e Sêneca inspiraram a maior assessoria financeira independente do Brasil

(Valor Econômico) Sócio-fundador da Seneca Evercore, o economista baiano Daniel Wainstein prevê um volume recorde de M&As neste semestre Por Daniel Salles


Nascido quatro anos antes de era Cristã, Sêneca era um fidalgo espanhol que fez carreira meteórica em Roma. Homem de letras, escreveu tragédias de sucesso e foi um grande entusiasta do estoicismo, doutrina que prega que a verdadeira felicidade está diretamente ligada à indiferença pelos males físicos e morais e à resignação ao que o destino nos impõe.

Como homem de negócios, criou sozinho uma espécie de banco privado que lhe permitiu amealhar uma fortuna estimada em quase 360 milhões na moeda corrente, o sestércio - em euros, daria praticamente a mesma cifra. Por outro lado, o pensador elogiava o desprendimento e a frugalidade a ponto de recomendar que, uma vez por semana, se dormisse no chão e só se comesse pão preto. Uma das frases mais conhecidas do filósofo, que viveu até o 65º ano da era Cristã, é esta: “Pobre não é o homem que tem pouco, mas o homem que anseia por mais. Qual é o limite adequado para a riqueza? É, primeiro, ter o que é necessário, e, segundo, ter o que é suficiente”.

Outro dito célebre de Sêneca é repetido por Daniel Wainstein logo no início deste “À Mesa com o Valor”: “Sorte é o que acontece quando a preparação encontra a oportunidade”. É uma frase, diz em seguida, que norteia seu trabalho. “Fortuna, a deusa da sorte, era representada com os olhos vendados porque ela determina aleatoriamente o que vai acontecer”, explica. “O que realmente importa? O que você faz com o que tem na mão.”

Não é de estranhar que uma conversa com o economista costume enveredar para rumos filosóficos. Fascinado pelo assunto, ele batizou sua assessoria financeira, especializada em fusões e aquisições (M&As, na sigla em inglês), reestruturações e mercado de capitais, com o nome do fidalgo espanhol, optando pela grafia em latim. Falamos da Seneca Evercore, tida como a maior companhia do gênero no país entre as independentes. Ela transacionou no ano passado, segundo a plataforma Dealogic, que se debruça sobre esse universo, US$ 2,7 bilhões com M&As. O segundo colocado no ranking, o Rothschild, foi responsável por US$ 1,8 bilhão, e o terceiro, a Ernst & Young, por US$ 1,5 bilhão.


Outro que adora filosofia é Rodrigo Mello - é um dos três sócios seniores da Seneca Evercore, além de Wainstein e Isaias Sznifer. “Gostamos muito dos valores estoicos e não só de Sêneca, mas também de Epíteto e Marco Aurélio”, diz o entrevistado, citando dois pensadores que aderiram à mesma doutrina - o filósofo turco viveu de 50 EC a 138 EC e o antigo imperador romano, de 121 EC a 180 EC. “Eles legaram princípios que realmente nos ajudam a manter um negócio do qual nos orgulhamos.”

Depois, conta que aprendeu a administrar melhor as próprias expectativas lendo a obra de Aurélio. “A expectativa, diz a mitologia grega, foi um dos males que saiu da Caixa de Pandora”, acrescenta. “A frustração é o resultado de uma expectativa que não foi cumprida.” Em seguida, lembra da aversão de Immanuel Kant (1724-1804) pela mentira. “Para o filósofo alemão, não havia nada que a justificasse”, resume. Diz isso para afirmar que a assessoria financeira dele não recorre a mentiras para tirar nenhuma operação do papel. “Não aceitamos e por parte de ninguém do nosso time”, salienta. “Obviamente, não somos obrigados a falar tudo a respeito dos nossos clientes, até por uma questão de confidencialidade. Mas só falamos a verdade. Não inflamos o valuation, por exemplo, ou alegamos que nossos clientes já receberam propostas que não existiram. Tudo isso contribui com a nossa credibilidade, um ativo importante nesse segmento.” A assessoria financeira ocupa meio andar de um prédio na Faria Lima, em São Paulo. Para o nosso almoço, Wainstein selecionou um francês a poucas quadras, o Freddy. “Minhas filhas não acham que é um dos restaurantes mais badalados de São Paulo, então com a família venho pouco”, diz, ao justificar a escolha do local. “Mas a comida, todo mundo concorda, é muito boa.” Precedido pelo assessor de imprensa da Seneca Evercore, Wainstein chega no horário marcado, 12h. É quando o restaurante, na ativa desde 1935, começa a funcionar - está explicado porque, a essa altura, somos os únicos clientes. Quando nosso almoço termina, quase duas horas depois, restam poucas mesas livres. Elas foram sendo ocupadas, em poucos minutos, praticamente só por homens. Que se vestem, quase todos, da mesma maneira: calça social preta ou azul escuro, camisa clara com as mangas dobradas acima do punho e sapatos pretos, de couro. Foi o figurino adotado, por exemplo, pelo ex-governador de São Paulo Rodrigo Garcia, que foi encaminhado para uma mesa não muito longe da nossa, uma das mais distantes da entrada. O economista optou por um figurino não muito diferente: camisa cinza claro, costume azul-marinho, sapatos pretos de couro e óculos de grau de armação verde.

“Hoje tem estrogonofe?”, ele pergunta para o maître quando este aparece com os cardápios. Dada a resposta afirmativa, Wainstein bate o martelo nesse prato, dando adeus aos planos de se contentar com uma opção mais light. “Sempre entro aqui convencido a comer algo como linguado com legumes, mas acabo mudando de ideia”, revela. Quando chega o prato do fotógrafo - filé à chateaubriand com molho béarnaise -, interrompe o que estava dizendo para elogiar o tamanho da carne. “No final do ano, fiz um regime de duas semanas para voltar a ser gordo, pois já tinha passado desse patamar”, exagera em seguida.


Talvez tenha sido por isso que sequer encostou no couvert, composto de azeitonas, picles, cenoura crua, patê de cenoura, manteiga, queijo parmesão, croissant, baguete e torradas. Para beber, se limita a uma água sem gás. Quando o garçom aparece com o estrogonofe, cuja porção serve duas pessoas e é compartilhada com este repórter, solicita só “um pouquinho” de batata palha. Mas dá poucas garfadas, pelo menos enquanto a comida ainda está quente - concentrado na conversa, ele só se poria a comer quando o almoço estava perto do fim. A Seneca Evercore é o desdobramento da assessoria financeira que Wainstein, Mello e Sznifer montaram em 2014. Tratava-se, inicialmente, de uma empresa afiliada ao Greenhill & Co, banco de investimentos criado por Robert F. Greenhill, ex-presidente do Morgan Stanley. Em 2020, o trio comprou a participação desse banco e, na sequência, vendeu 20% para outro, o Evercore - foi quando ganhou o nome atual. Na prática, porém, a assessoria financeira é a mesma desde 2014.

John Weinberg, CEO do Evercore, foi um dos líderes globais do banco de investimentos do Goldman Sachs e vice-presidente do grupo. Foi chefe, portanto, de Wainstein, primeiro e único brasileiro a virar sócio do Goldman. A operação verde-amarela do banco de investimentos dessa instituição foi comandada pelo entrevistado entre 2008 e 2013. Com a ida de Weinberg para o Evercore, abriu-se a possibilidade de este banco virar sócio da assessoria financeira fundada por Wainstein e companhia. Ao recordar os bastidores do enlace, o entrevistado resume um dos ensinamentos de Epiteto: concentre-se no que é possível controlar. “Não tive controle sobre a mudança de Weinberg para a Evercore”, argumenta. “Mas, com ele lá, agi para construir a sociedade.” Nesse caso, a frase de Sêneca sobre sorte e oportunidade também viria a calhar.

Wainstein e os demais sócios seniores da Seneca Evercore se conhecem de longa data. Com Mello, ex-diretor-gerente do Goldman Sachs, trabalha há 25 anos. “Criamos amizade fraternal”, resume o entrevistado. “Ele virou mais que um irmão.” Também se diz muito próximo de Sznifer, outro que trabalhou naquela instituição americana. “Fui chefe dele lá”, informa em seguida, arrependendo-se no mesmo instante do que disse. “Falar chefe é ruim”, corrige-se. “Éramos colegas.” O chefe da área de renda fixa, criada neste ano, é Luis Miraglia, que foi diretor-gerente do Morgan Stanley - é amigo de Wainstein desde a quarta série do ensino fundamental.



O que motivou o trio a se aventurar por conta própria no universo da assessoria financeira? Antes de responder à pergunta, o economista registra que o Goldman Sachs foi “excelente escola”. “A gente tinha o sonho de fazer uma empresa que não nos forçasse a fazer tudo que aparecesse”, diz. “Hoje selecionamos clientes até por critérios éticos. Antes de dar início a um novo relacionamento, conversamos com o cliente em potencial para conhecer sua história e sentir se os valores dele são semelhantes aos nossos. Não vamos trabalhar, por exemplo, com quem quer que ‘maquiemos a noiva’ para dar a impressão de que ela é diferente do que realmente é.”

Ao relembrar da decisão de montar o próprio negócio, faz menção a uma frase atribuída ao conquistador espanhol Hernán Cortés (1485-1547): “queimem os navios”. Teria sido dita durante a destruição do Império Asteca para que ficasse claro para os subordinados dele que não havia hipótese de recuarem - sim, Cortés se referia às embarcações espanholas. “Também ‘queimamos’ nossos ‘navios’”, compara Wainstein. “Nossa assessoria financeira tinha que dar certo, mas do jeito certo. Não valia ganhar por ganhar. Começamos a ter lucro em 2015. Se eu soubesse disso em 2014, o início teria sido mais tranquilo. Porque os primeiros meses pareceram uma eternidade.”

Diz que ao longo dos últimos dez anos nenhum funcionário do trio pediu demissão para ir trabalhar em uma empresa concorrente. É sinal, argumenta, de que eles conseguiram criar um ambiente que valoriza os colaboradores - são cerca de 35, hoje em dia. “Todo mês, eu, o Rodrigo ou o Isaias nos sentamos, individualmente, com todo mundo - dos demais sócios ao estagiário - para perguntar como estão as coisas”, diz. “Se alguém não está bem, sugerimos férias ou tentamos ajustar a carga de trabalho.”

Que a vida de empreendedor lhe abriu as portas para um estilo de vida menos tenso, não há dúvida. Do contrário, seu filho caçula, com sete anos na época do desligamento do Goldman, não teria lhe dito o seguinte pouco tempo depois: “Você parece um pai diferente”. O filho, hoje em dia, está com 18 anos. O economista também teve duas filhas - uma tem 23 anos e a outra, 22. O trio é fruto do casamento dele com a arteterapeuta Luciana Menossi, com quem engatou um namoro aos 17 anos de idade.

O que leva a maioria dos clientes a bater na porta deles é o interesse em vender uma parte de suas companhias - com o intuito, às vezes, de angariar recursos para impulsionar o crescimento do negócio. Também há casos de empresas que contratam a Seneca Evercore para que ela ajude na negociação de dívidas com bancos. E há quem procure a firma de Wainstein decidido a se desfazer inteiramente da própria corporação - é muito comum em se tratando de empresas que passaram das mãos de uma geração para outra. “Basicamente, aconselhamos qual é o melhor caminho a ser tomado”, afirma o entrevistado.

Acrescenta que a Seneca só se dispõe a atender companhias que tenham potencial para atrair investidores ou compradores. “Precisamos acreditar no sucesso da operação que está sendo solicitada”, explica. “Senão não adianta, pois a maior parte do nosso faturamento vem daí.” Nas mesas de negociações, é com grandes bancos que a assessoria financeira costuma se sentar. “Não somos uma loja de carros que vende para pessoas que não sabem nada de automóveis”, compara. “Costumamos negociar com pessoas altamente capacitadas e que fazem as próprias análises a respeito dos nossos clientes. Queremos, claro, maximizar os ganhos deles, mas, no fundo, precisa ser um bom negócio para todo mundo.” No ano passado, a assessoria financeira atuou do lado da Magnetis na aquisição dela pelo BTG Pactual. Primeira “wealth tech” do Brasil, ela desenvolveu um software que decide a alocação ideal de ativos para seus clientes baseada em metas individuais e nos perfis de risco de cada um. Ainda em 2023, a Seneca assessorou o conselho de administração da Arco Educação durante o processo de fechamento de capital da companhia, que estava listada na Nasdaq. As gestoras General Atlantic e Dragoneer ofereceram US$ 14 pelas ações em circulação, o que fez com que o valuation da Arco chegasse a US$ 1,5 bilhão. No mesmo ano, Wainstein e seus sócios ajudaram a fintech porto-riquenha Evertec, especializada em processamento de pagamentos eletrônicos, a arrematar a companhia de software brasileira Sinqia, cujas ações deixaram de ser negociadas na B3. A compra foi fechada por cerca de R$ 2,5 bilhões. Outra transação digna de nota envolve o Magazine Luiza, que recorreu à Seneca para se desfazer de sua participação em sua seguradora, a LuizaSeg. Esta foi criada pela varejista em parceria com o BNP Paribas Cardif, que, com a entrada em cena de Wainstein e companhia, acabou ficando com o negócio todo. Com a transação, o Magazine Luiza espera embolsar R$ 1 bilhão.

Em caso de conjunturas econômicas desfavoráveis, a Seneca Evercore costuma aconselhar seus clientes a deixar para depois - do contrário, as cifras envolvidas poderão ser bem menores que o previsto. Foi uma recomendação repetida diversas vezes no primeiro semestre do ano passado. Naquela época, afinal, muitas empresas enfrentavam dificuldades ainda em função dos rombos legados pela pandemia e da escalada da Selic. “Muitas companhias contraíram dívidas com juros de 2%, 3%, que subiram para 13% quando o faturamento ainda estava comprometido”, explica o economista.

Não significa que a assessoria financeira, nesse período, ficou de papo para o ar. Costurou, principalmente, transações de recuperação, que nem chegaram a ser anunciadas. “Eu diria que operações do tipo, nesta época, movimentaram cerca de R$ 30 bilhões no Brasil”, estima o entrevistado. Foram costuradas sem alarde, como é de imaginar, para não atrair repercussão negativa. Segundo ele, o interesse dos investidores estrangeiros pelo Brasil aumentou muito de 2023 para cá. No ano passado, tanto a agência de classificação de risco Fitch quanto a S&P Global elevaram a nota de crédito do Brasil de BB- para BB. “Podemos esperar, neste semestre, novas melhorias nesses ratings”, avalia. “Isso porque a questão econômica do país, por enquanto, está muito bem equacionada. A inflação está controlada, as taxas de juros estão decaindo, o crescimento está sendo retomado - surpreendentemente, inclusive -, o patamar de desemprego está baixo e o equilíbrio fiscal prometido pelo governo federal, aparentemente, não deixou de ser um objetivo.” Ele completa: “Podemos esperar o anúncio de vários e grandes M&As neste semestre, provavelmente em volume recorde. E, consequentemente, a retomada dos IPOs no segundo semestre”. Diz tudo isso para expressar preocupação com falas como a do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a respeito da guerra de Israel contra o Hamas - o petista acusou o exército israelense de conduzir um genocídio em Gaza. “Sob Bolsonaro, o Brasil entrou numa lista de restrições de muitos investidores estrangeiros em função dos questionamentos dele contra a democracia e a ecologia”, lembra. Comparações como a de Lula poderiam colocar o país novamente em listas indesejadas. Wainstein viu a frase de Lula como afronta pela ótica de economista e pela judaica. Seus avós tanto paternos quanto maternos eram judeus e fugiram da Europa para escapar do antissemitismo. Os primeiros eram da Moldávia e os segundos, da Ucrânia. No Brasil, todos acabaram radicados em Salvador, onde o economista nasceu há 54 anos. “Pelo meu fenótipo , muita gente, ao me conhecer, acha que sou gringo”, admite ele, que conserva muito pouco do sotaque baiano.

Filho de uma nutricionista e de um engenheiro civil, ele passou a infância e a adolescência na Barra, um dos bairros mais visitados da capital baiana. “Cresci empinando pipa e tocando violão no Farol da Barra”, recorda. “Para ser ‘cool’ em Salvador, era preciso surfar, jogar capoeira ou tocar violão. Como eu nunca consegui ‘dar uma estrela’ ou ficar de pé numa prancha, sobrou só a música.” No final da adolescência, mudou-se para São Paulo determinado a cursar medicina. Mas só até assistir, no Cine Bristol, em Salvador, na companhia dos pais, ao filme “O Segredo do Meu Sucesso” (1987), estrelado por Michael J. Fox. Na trama, o ator interpreta um garoto do Kansas que desembarca em Nova York, onde se torna um bem-sucedido executivo. “Imaginei que o mesmo poderia acontecer comigo em São Paulo”, admite, ao justificar a decisão de cursar economia.

Concluída a graduação, ele se mudou para os Estados Unidos, onde começou a obter o título de PhD na Universidade Brown, do qual desistiu para cursar MBA na Universidade de Rochester. Determinado a trabalhar no mercado financeiro, empregou-se no Lehman Brothers, em 1998. Quando este banco quebrou, dez anos depois, ele já dava expediente no Goldman Sachs, na filial brasileira.

A sede deste último fica em Manhattan. Quando ele trabalhava lá e sua mulher estava grávida da primeira filha do casal, a família morava em Jersey City, do outro lado do rio Hudson. Wainstein costumava estar no Goldman Sachs a partir das 9h, mas, numa certa manhã, resolveu sair de casa um pouco mais tarde - isso porque a negociação que estava tocando subira no telhado no dia anterior. Seu trajeto, de metrô, incluía a antiga estação do World Trade Center - cujas torres foram atingidas por dois aviões entre 8h46 e 9h03 daquele dia, 11 de setembro de 2001. “Podíamos ver as Torres Gêmeas da nossa casa”, recorda o economista, que nunca teve tanta sorte como naquela manhã. Publicada em: https://valor.globo.com/eu-e/noticia/2024/04/12/como-o-estoicismo-e-seneca-inspiraram-a-maior-assessoria-financeira-independente-do-brasil.ghtml

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